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“A questão não é simplesmente contratar um neurocirurgião. É instalar uma unidade de cirurgia. E isto implica em montar equipe, ter as condições necessárias, como leitos em UTI sempre disponíveis. É um assunto complexo e não dá para discutir sem conhecimento técnico”.
O comentário é do experiente médico Jorge Pelisson, cirurgião geral, com pós-graduação em saúde coletiva, procurando esclarecer um dos assuntos que mais se comenta em Paranavaí: a contratação de um neurocirurgião para atender na cidade.
A Santa Casa não tem obrigação de contratar o neurocirurgião, “mas estamos tentando. O problema é que existem poucos profissionais no mercado. Achar um neurocirurgião é como procurar uma ‘mosca branca’”, diz o coordenador administrativo do hospital, Héracles Alencar Arrais.
“Temos feito uma busca ativa de neurocirurgião. Mas não estamos encontrando. Aliás, estamos precisando de um plantonista para a UTI e nem este profissional estamos achando”, constata o médico Michel Spigolon Abrão, diretor técnico e chefe da UTI da Santa Casa.
“Seja para ter um neurocirurgião ou qualquer outra especialidade de alta complexidade, como a cirurgia cardíaca, a questão salarial é importante, mas talvez seja o menor dos problemas. A questão é dar condições para o médico fazer um bom trabalho”, reforça o diretor-clínico da Santa Casa, Rubens Costa Monteiro Filho.
Michel sublinha que uma das maiores dificuldades, que se equipara à questão salarial, é que o especialista não dá prioridade para uma cidade onde ele vai ser o único neurocirurgião. “Nenhum neurocirurgião quer ficar sozinho numa cidade, pois ele fará plantão 24 horas por dia, 30 dias do mês, 365 dias do ano. Não tem direito nem a tirar férias”, explica ele. Além disso, complementa o cirurgião Pelisson, “ele (o neurocirurgião) tem que ter alguém com quem discutir algumas situações, dividir suas angústias”. Para Pelisson, Abrão e Costa Monteiro, implantar a neurocirurgia em Paranavaí significa contratar, no mínimo, dois médicos.
Segundo Michel Abrão, o neurocirurgião Danilo Bernardi, que atuou em Paranavaí e posteriormente se transferiu para Umuarama, levou em conta, além das condições financeiras, o fato de lá já ter dois colegas para dividir as atividades.
FALTAM LEITOS - Ainda que se viabilizem recursos para o salário de dois médicos, a implantação de uma unidade de neurocirurgia em Paranavaí teria que levar em consideração a disponibilidade de leitos. “Hoje estamos com dificuldades para leitos clínicos e de UTI, seja para SUS, convênio ou particular”, atesta Arrais. “A neurocirurgia demanda mais leitos de UTI. A maioria dos pacientes de neurocirurgia vai para a UTI e hoje já estamos operando com mais de 90% de sua capacidade”, confirma Michel.
“A nossa UTI está praticamente lotada. Os 10 leitos estão sempre ocupados. E a maioria dos pacientes de neurocirurgia precisa de UTI. Enquanto a maioria dos pacientes que sofre uma cirurgia e fica na UTI 24 horas para observação e já vai para o quarto, os pacientes de neurocirurgia ficam 5, 10 e 15 dias. E há casos de seis meses. Tendo a neurocirurgia em Paranavaí teríamos que ter disponível permanentemente dois ou três leitos de UTI na Santa Casa”, adianta Costa Monteiro.
Neste sentido, concluir o Hospital e Maternidade Noroeste pode ser a solução. “Quando começamos a trabalhar para que o Hospital Noroeste fosse para a Santa Casa, tínhamos em mente a ampliação de leitos comuns e de UTI, permitindo o avanço de algumas especialidades, como a emergência cardíaca, a neurocirurgia e a oncologia”, informa o prefeito Rogério Lorenzetti. “Enquanto não temos leitos de UTI, o SAMU vai nos auxiliar, pois o serviço tem uma UTI móvel, permitindo a transferência de um paciente em estado grave para outros centros com disponibilidade de vaga”, complementa ele.
O diretor clínico da Santa Casa concorda que o Hospital Noroeste vai viabilizar algumas especialidades. “Temos sempre que levar em conta as condições do médico. A necessidade de leitos de UTI é imperativo. Se simplesmente contratamos um neurocirurgião, corremos o risco de ter o paciente, o médico e a cirurgia não se realizar porque não vamos ter um leito de UTI para deixar este paciente. A situação é bem diferente da visão leiga. Então o Hospital Noroeste pode vir a minimizar a atual situação de saturação da Santa Casa, com abertura de novos leitos clínicos e de UTI”, diz ele.
“Não podemos esquecer que Paranavaí está no Brasil, não nos Estados Unidos ou num país da Europa. Os problemas daqui (falta de leitos, falta de UTI, falta de médicos, etc) são problemas nacionais”, enfatiza Pelisson. Segundo ele, “hoje temos problemas de leito para uma cirurgia de vesícula”.
Pelisson diz que a falta de neurocirurgião é também nacional. “É um profissional raro. Depois do médico formado, leva-se cinco anos para formar um bom neurocirugião. E nós precisamos pelo menos de dois”, explica o cirurgião.
Expectativa financeira – Os médicos não confirmam, mas também não descartam que a expectativa de um neurocirurgião é receber, ao final do mês, algo em torno de R$ 30 mil. Mas não é este o dinheiro que a Santa Casa teria que desembolsar.
Na prática, o médico receberia um valor da Santa Casa para fazer o plantão (como é feito em outras especialidades) e o restante seria complementado com a remuneração do SUS. Além disso, o médico poderia atuar, por exemplo, no Centro Regional de Especialidades (CRE), planos de saúde e em consultório particular.
Nesta engenharia financeira, a situação se rompe em dois pontos: como se trata de uma especialidade cara, são raros os atendimentos particulares e, no outro ponto, a remuneração do SUS é muito baixa. Para se ter uma ideia, o SUS paga por uma cirurgia de aneurisma cerebral R$ 448,00 para a equipe médica (cirurgião, assistente e anestesista) e R$ 1.050 para o hospital (bloco cirúrgico, hotelaria e medicamentos). A média de internamento num caso desses é de quatro dias. Mas se houver uma complicação e o paciente ficar 15 dias internado, nem o médico nem o hospital ganham um centavo a mais.
A tabela do SUS é desestimulante. Numa cirurgia vascular, o sistema paga R$ 241,00 para a equipe médica e R$ 447,00 para o hospital. O tempo de internação médio é de três dias nestes casos. Mas a maior aberração desta tabela se verifica na UTI. O SUS paga R$ 478,00 a diária (aí incluídos médico, medicamentos, equipamentos, insumos, hotelaria etc). Na UTI em pacientes enfartados utiliza-se um medicamento injetável (streptoquinase) que custa aproximadamente mil reais. E o SUS reembolsa apenas R$ 432,00. Na UTI Neonatal é a mesma coisa: o medicamento surfactante para facilitar a respiração do bebê, custa aproximadamente R$ 1.200 e o SUS reembolsa apenas R$ 519.
Hospital aberto – Michel Abrão e Jorge Pelisson rechaçam os rumores de que não vem um neurocirurgião para Paranavaí porque a Santa Casa é um “hospital com corpo clínico fechado”. Admitem que no passado tratava-se de uma instituição que os médicos tinham dificuldade de acesso. “Isto é coisa do passado e bem passado. Médico competente, preparado e idôneo tem espaço na Santa Casa. Hoje estamos precisando de médicos especialistas”, diz Pelisson. O comentário do cirurgião é corroborado pelo administrador Arrais: “Nos últimos seis anos ingressaram no corpo clínico da Santa Casa 29 novos médicos. São especialistas competentes, idôneos e passaram a integrar nosso corpo clínico”.
Ao contrário dos rumores, a busca ativa não é apenas atrás de neurocirurgião. “Estamos precisando de plantonistas para a obstetrícia, pediatria, UTI e cirurgia vascular”, informa Michel Abrão. A cirurgia vascular é a que mais preocupa e há o risco deste serviço ser paralisado na Santa Casa por falta de médicos. “Fala-se tanto em neurocirurgião e reconhecemos que há necessidade, mas hoje estamos correndo o risco de ficar sem cirurgia vascular. No corpo clínico do hospital tem dois médicos que atendem ao SUS e eles podem sair”, lamenta Arrais.
A busca por mais médicos vai continuar, assim como de um neurocirurgião. “Acho que com a incorporação do Hospital Noroeste teremos mais leitos, melhores condições que poderão atrair profissionais para a cidade. Mas não basta boa vontade nossa. É preciso ter as condições para o profissional atuar satisfeito na cidade.”, assevera Pelisson, lembrando que “a Santa Casa triplicou o atendimento nos últimos 10 anos e o número de cirurgias triplicou nos últimos cinco anos. Mas a população não triplicou neste período. O que assistimos é uma mudança no nível de exigência da população, o avanço da medicina e até situações pontuais, como o crescimento da frota de motocicletas e os acidentes com elas, que demanda atendimento médico-hospitalar. Mas estamos avançando e vamos continuar neste processo”, finaliza o cirurgião.
Rubens Costa Monteiro Filho acredita que o Hospital Noroeste vai ajudar resolver boa parte dos problemas. E a Santa Casa vai continuar atuando para dar boas condições de trabalho. “Hoje precisaríamos dobrar o número de médicos e de leitos. E acho que em seis meses a situação estaria saturada novamente, porque a população da região vem pra cá. E isto não é culpa de ninguém, de A ou B. É uma somatória de situações que aos poucos vai se resolvendo”, diz o diretor-clínico do hospital.
Fonte: Secretaria de Comunicação Social - Prefeitura do Município de Paranavaí